21.3.10

roda viva



"gostava tanto do dia do pai quando era pequenina", disse "fazíamos os presentes na escola. não é como hoje, que tenho de gastar dinheiro e andar para aí à procura de alguma coisa de jeito!"
"gostava que o dia do pai não fosse só para o resto do mundo. gostava de poder existir neste dia."
"o que é que queres dizer com isso?"
"nada. não tenho presente para o dia do pai. achas que pode ser uma música? achas que, virtualmente, vale? eu acho que ele ia gostar deste vídeo. acho que ele ia gostar de estar comigo, só isso já nos bastava."
"não sei, tenta."
"espero que ele tenha saudades minhas."
"terá com certeza."

prima vera

bem-vinda!

17.3.10

o livro chamou-me

tendo andado cheia de obrigações até ao miolo, venho aqui num instantinho publicitar um livro que estou a ler desde o fim-de-semana (lê-se num instantinho, que pena) que tem sido uma das poucas pitadas de sal com as quais tenho conseguido saborear melhor esta semana.
chama-se os objectos chamam-nos, de juan josé millás e é... bem... diferente.


"Quando a mulher de pasta de papel e gesso e eu ficámos frente a frente, no pequeno quarto das traseiras, tirei-lhe com a garganta seca a camisola que tinha vestida e confirmei que, de facto, tinha os sovacos húmidos. Também eu me humedeci nesse instante, sem o poder evitar. Havia outros dois empregados atrás de mim, preparando adornos e penduricalhos, mas nenhum deles se apercebeu. O manequim, sim. O manequim olhou para mim com um sorriso carregado de intenção.
Foi o melhor Natal da minha vida e ainda hoje, quando penso nele, não sou capaz de imaginar uma iniciação sexual mais rica do que a que recebi daquele boneco que transpirava."

14.3.10

auto-autópsia

hoje estou a brincar às profissões. faço-o muitas vezes. normalmente, fecho-me na casa-de-banho enquanto experimento maquilhagens e visuais esquisitos no cabelo. faço o favor de interpretar duas personagens - a cliente e a profissional - e elaboro diálogos interessantes entre as duas, que nem sempre acabam bem.

hoje, portanto, no intervalo de tempo que me concedo entre cada hora de estudo, sou um escritor falhado. está um belo dia lá fora, e cá estou eu de pijama, no meu escritório a fingir, à espera de inspiração divina para o meu próximo livro.
espreguicei-me e suspirei. talvez um pouco de música ajude. e quiçá pipocas.
agora tenho um balde de pipocas que consumo freneticamente para me consolar o estado inerte com que encaro o mundo. e assim é. neste momento, vivo num último andar de um prédio a cair de podre nos subúrbios de paris e alimento-me de pipocas de microondas e de enlatados. e uso uma boina daquelas cor de caca.
estas pipocas deixam-me agoniado - sim, sou um homem, até tenho aquele bigode à francês que se enrola nas pontas - tão agoniado me deixam, que mais quantidade coloco raivosamente nas mãos para levar à boca;  tão pouco tempo tenho para mastigar que volto a infligir-me mais um valente punhado de pipocas. já mal consigo respirar, mas esforço-me por me manter calmo. não sei porque faço isto. ou talvez saiba - traz-me um certo conforto de infância.
a minha mãe dava-me mais uma colherada de sopa, e mais outra, eu já não conseguia mais mas, vá-se lá saber porquê, arranjava sempre espaço para mais uma: "esta é pela mamã; esta é pelo papá; esta é pelo avô; esta é pelo senhor do talho" e assim por diante, sabem como é. não me passava pela cabeça deixar alguém de fora, tinha medo que as pessoas viessem assombrar-me mais tarde "não comeste a colher de sopa por mim!". a verdade é que nunca ninguém me assombrou, e eu acreditava que assim era porque sempre comi tudo o que me mandavam comer.

hoje estão todos mortos. todos. não tenho mais de comer uma colher por ninguém e a sensação que isso me traz é de uma liberdade imensa, aliada também de alguma solidão.

à medida que acrescentava pipocas ao amontoado que tinha na boca, repetia "esta é por mim" cada vez mais alto, pois não havia mais ninguém que eu conhecesse que merecesse a dedicatória de uma mão cheia do que quer que fosse. eu tinha de fazer aquilo por mim. os sacrifícios nem sempre são maus, e eu tinha de me mentalizar de que tinha de sofrer para ficar bem. a respiração tornava-se mais dolorosa e difícil, mas eu fui perseverante. comecei a sentir pequenos espasmos nos pulmões e não parava de gritar interiormente que estava a fazer aquilo por mim. eu precisava daquilo. eu precisava daquela demonstração de amor. se me pudesse ver ao espelho, sei que estaria provavelmente azul, com as veias da testa demasiado salientes. nesse momento estava já caído da cadeira, contorcido no chão, a ver o balde de pipocas rolar à minha frente. não sei se foram endorfinas libertas ou simplesmente a minha alma a elevar-se, mas comecei a sentir-me relaxado.
deixei-me permanecer estendido no chão num heróico acto de estoicismo quando o meu coração começou a perder oxigenação e, lentamente, o sangue cessou de circular no meu corpo.

7.3.10

fatalidades

hoje andei a brincar às conduções com o meu irmão.

façamos figas para que não me torne na psicopata do trânsito.

2.3.10

mulheres VS mulheres

uma coisa que realmente me desperta interesse são as mulheres e a sua interacção social. é uma verdade irrefutável que as fêmeas criam, à partida, um ambiente de antipatia entre si, se confrontadas em situações menos favoráveis, principalmente se a presença de um macho se fizer sentir. isto nos animais, regra geral, é muito fácil de se observar. tenho uma cadela e, quando a levo à rua, não a posso deixar muito próxima de outras cadelas.
em contrapartida, o organismo feminino tem um super-poder qualquer que faz com que mulheres que passem grande parte do seu dia juntas, durante muito tempo, tenham os respectivos ciclos menstruais sincronizados. é uma espécie de postura solidária que os nossos úteros e as nossas hormonas adoptam, unindo-se contra tudo e contra todos. o único problema é a maldita tpm (tensão pré-menstrual), que afecta uma grande fatia deste bolo que é o mundo das mulheres.
irritabilidade, sensibilidade, ansiedade, tensão, agressividade, fadiga e insónia são alguns dos imensos sintomas que a tpm pode apresentar. imaginemos então um quarto com dez mulheres em pleno estado pré-menstrual, com um diagnóstico abusivo de tpm.

este é que é o verdadeiro apocalipse.

ai, estas mulheres...

1.3.10

cien años de soledad

"às vezes ficavam em silêncio até ao anoitecer, um em frente do outro, olhando-se nos olhos, amando-se no sossego como antes se amaram no escândalo."