30.11.11

eu, moi, me, ich, yo, etc e tal

"Começo a conhecer-me. Não existo. 
Sou o intervalo entre o que desejo ser e os outros me fizeram, 
ou metade desse intervalo, porque também há vida ... 
Sou isso, enfim ... 
Apague a luz, feche a porta e deixe de ter barulhos de chinelos no corredor. 
Fique eu no quarto só com o grande sossego de mim mesmo. 
É um universo barato."
ÁLVARO DE CAMPOS


começo a conhecer-me,
com o stress e a pressão, uma pessoa aprende a ser muito mais modesta e humilde face à vida; o espaço que deixei cativo para o telemóvel que ia comprar, ocupei-o com um chocolate quente ao fim da tarde. a sensação que achava que ia ter por ganhar o totoloto encheu-me a alma quando tocou a minha música preferida na rádio. rezava a deus para que conseguisse o emprego que quero, agora deixa-me bem mais descansada enrolar-me nos meus cobertores quentinhos e saber que os tenho sempre aqui à minha espera.
e tenho escrito mais, sei lá, eu acho que sei, digo que é porque a energia que ia estoirar desrespeitosamente com uma saída à noite tem de ser salpicada algures, e não é no papel porque custa mais - só custa mais hoje, porque estou feita um caco, nos outros dias pode ser como mais jeito me der - e o computador estava mesmo aqui, já agora uma música. não pode ser uma qualquer, tem de ser bem escolhida para não me cansar nem me entusiasmar demasiado,
Sou o intervalo entre o que desejo ser e os outros me fizeram
na verdade, ninguém me pode dizer a verdade, porque para mim é assim e tenho todo o direito de fechar os ouvidos ao que me apetecer. o que é que me apetece? não me importava de ir fazer tricot, mas apetece-me? que bom, que bom poder dizer-me 
     "não és obrigada a nada, faz só o que te motivar a levantar esse rabo daí, o mundo continua a funcionar perfeitamente sem ti"
e neste momento noto que não o digo com dor nem com tristeza, mas sim com um certo alívio. e respondo:
    "essa foi a coisa mais bonita que já ouvi, agora posso estar descansada e deixar o resto para os restantes"
porque se fico a não contribuir em nada para a órbita da terra, isso a ninguém diz respeito. sinto-me até rebelde.
    "tomem todos, não vos estou a servir para nada"
somando-se quiçá umas asneiras, que não as digo, mas agora sou só eu e a minha micro-sociedade, eu e os meus pensamentos, e convivemos perfeitamente em regime de anarquia.


é um universo barato.